Publicado em: 08 de julho de 2022 12h07min / Atualizado em: 11 de julho de 2022 09h07min
Uma consultoria realizada pela estudante da UFFS – Campus Chapecó Maria Gabriela Knapp gerou a redução da produção de resíduos e de gastos desnecessários e, ainda, resultou na primeira certificação Lixo Zero a uma indústria gráfica da América Latina. Maria está quase finalizando o curso de Engenharia Ambiental e Sanitária e foi a responsável por todo o trabalho que envolveu várias etapas na empresa e a auditoria de uma credenciada do Instituto Lixo Zero Brasil.
As duas etapas da auditoria constataram que a empresa conseguiu chegar ao índice de desvio de 99% dos materiais de aterro sanitário e nível de boas práticas nota A. Para chegar até esse ponto, foram meses de trabalho, com reuniões, avaliações, diagnóstico, proposições de soluções e implementação.
Maria, que já é tecnóloga em Gestão Ambiental e pós-graduada em Gestão Ambiental aplicada à indústria, atua em uma empresa de assessoria e consultoria ambiental de Chapecó. Ela está prestes a se formar em Engenharia Ambiental e Sanitária na UFFS – Campus Chapecó e considera que a experiência, os estudos anteriores e o curso foram fundamentais para que ela pudesse realizar a consultoria, cujo resultado foi o esperado pela empresa: uma certificação de Lixo Zero.
Ela cita que disciplinas do curso como Gestão de Resíduos, Tratamento de Resíduos, Avaliação de Impacto Ambiental, Meio Ambiente, Economia e Sociedade, Direito Ambiental, Gestão Ambiental de Empresas deram base para que conseguisse atuar. A aluna comenta que precisou linkar os conhecimentos adquiridos e compreender como eles se inter-relacionavam. “Sempre fui curiosa, sempre quis fazer, quis aprender. Isso ajudou também”, revela.
Conforme o coordenador do curso, professor Marlon Neves da Silva, “o objetivo principal desses componentes curriculares é proporcionar ao acadêmico ferramentas e conhecimentos acerca da correta gestão de diferentes tipos de resíduos, bem como o contato com tecnologias disponíveis e pesquisas referentes ao tratamento e disposição final de resíduos de variadas origens, como o urbano, industrial, agrícola, entre outros. Nossos alunos e egressos, por meio desse currículo formativo, apresentam capacidade e atribuição técnica no desenvolvimento dessa área. Dessa forma, para o futuro engenheiro ambiental e sanitarista, essa temática se apresenta como um vasto campo de atuação profissional, seja na área pública ou privada, sendo um nicho importante de atuação”.
Maria conta que um colega também fez o estágio obrigatório durante as fases iniciais da consultoria. E, para além de todos os aprendizados, ela descreverá todas as etapas da consultoria em seu trabalho de conclusão de curso.
Sobre a consultoria
O desafio foi grande, segundo ela, pois era sua primeira consultoria em uma indústria. A empresa, uma indústria gráfica, é de grande porte, com mais de 80 funcionários e mais de 30 anos de história na região. O objetivo da consultoria era, resumidamente, organizar todos os processos relativos ao gerenciamento dos resíduos, focando na obtenção da certificação.
Maria faz questão de explicar o conceito do “lixo zero”, já que, segundo ela, em geral, a maioria das pessoas não sabe o que significa. “O termo ‘lixo zero’ quer dizer não gerar lixo, que é a mistura de todos os resíduos. O nome que está na lei é resíduo, e o termo ‘lixo’ nem é mencionado. Uma vez misturados os resíduos, fica muito mais difícil fazer a separação e depois encaminhar a outro destino. O conceito ‘lixo zero’ também se atenta muito ao desvio de aterro sanitário, ou seja, uma vez que esse resíduo não vai para o aterro sanitário ou industrial, você oportuniza que ele gere trabalho, renda, ele vai voltar a um ciclo produtivo”.
O cenário era bom na indústria. Segundo ela, havia uma preocupação ambiental por parte dos sócios. Porém, ela acredita que, por falta de conhecimento, as ações nessa área não eram tão contundentes.
Foram três etapas da consultoria: diagnóstico, proposição de soluções e implementação. No diagnóstico, ela atuou para entender a situação na empresa. Fez visitas técnicas para observar e tirar dúvidas, fez contatos e reuniões.
Com as informações levantadas, fez um estudo e, em uma reunião, apresentou a situação da empresa sob o ponto de vista da gestão ambiental, além de propor soluções. O momento foi de apresentar o que considerava viável e da empresa analisar a implementação conforme suas possibilidades.
Para a etapa de implementação, após entender o que precisava ser feito, a empresa resolveu contratar um engenheiro ambiental e sanitário. Também foi feita uma reunião de sensibilização com os colaboradores, para que compreendessem do que se tratavam as mudanças propostas.
A fase de implementação foi dividida em três setores da empresa: o administrativo, a produção e o refeitório. A primeira mudança foi a retirada de lixeiras individuais de cada mesa, no setor administrativo. Elas não tinham identificação e não havia separação de resíduos. Assim, ficaram menos lixeiras, especificamente para papéis, e foi definido um local central para resíduos orgânicos e recicláveis. Além disso, foi estabelecido um local para a reutilização do papel.
Na produção, algumas ações já vinham sendo feitas, como a destinação de materiais para a ONG Verde Vida. Porém, não havia segregação desses materiais – plástico, papel e metal. Coletores (barricas de papelão reutilizadas - foto) foram identificadas e os materiais passaram a ser separados.
O local de materiais perigosos teve a identificação adequada, e foi especificado outro local para armazenar as caixas que são recolhidas pela Verde Vida.
“A maior parte do que é descartado não é desperdício, é resultado da produção. Mesmo assim, outros materiais resultantes da produção passaram a ser reaproveitados. Dois exemplos: na confecção do fundo das sacolas produzidas pela indústria, passou-se a reutilizar papel, pois o lado branco fica para cima e o impresso fica para baixo, não aparece na sacola; e a utilização do papel imune (das embalagens das resmas de papel compradas pela indústria), que agora embala alguns pedidos.
Tampas de latas metálicas de tinta, que geralmente não têm excesso de produto, passaram a ser entregues para a reciclagem. Até mesmo algumas embalagens de tinta começaram a ser raspadas, sendo retirada quase toda tinta de dentro, e, posteriormente, enviadas à Verde Vida.
Durante o processo de implementação, mais um encontro – dessa vez, de capacitação – foi realizado com os colaboradores. Além de mostrar como deveriam passar a atuar, foram tiradas dúvidas.
Por fim, no refeitório, que tinha a utilização de mais de 80 copos descartáveis por dia, iniciou-se a utilização de copos de vidro (que já estavam lá, mas não eram utilizados no dia a dia). Não havia separação dos resíduos, então foram feitas quatro segregações: de papel toalha, de recicláveis em geral, um específico para vidro e um para orgânicos, que são levados, agora, para uma composteira.
Em frente à indústria, foi feita a troca de uma grande caixa por um tonel bem menor. Maria explica que muita gente que não era colaboradora da empresa descartava outros resíduos naquele local e o tamanho do compartimento não condizia com a quantidade de rejeitos produzida pela gráfica.
“É um processo, a implementação não acontece do dia para a noite. É preciso tempo, disposição e certo orçamento. Preciso ressaltar que a empresa sempre acatou as sugestões. Eles confiaram nas indicações da consultoria”, destaca Maria.
Para a certificação, foram feitas duas auditorias. A primeira, remotamente, com o envio de um grande relatório com todas as informações do processo. Depois, uma auditoria in loco, que se baseou no relatório enviado. “O parecer leva em consideração o índice de boas práticas, baseado em várias ações feitas na empresa, não só de reciclagem, mas também de reutilização, redesign e a parte dos colaboradores, ou seja, como a empresa comunica isso aos colaboradores e como eles estão contribuindo para a ter a certificação. O índice tem quatro níveis, e o da empresa foi o A; a média de desvio de aterro sanitário foi acima de 99% — tanto em peso quanto em volume”.
A certificação tem renovação anual. Maria explica que a pessoa que faz a avaliação também realiza um parecer com ideias e dicas de outras questões que podem ainda ser implementadas, o que é muito positivo para a empresa.
O resultado de todo o processo foi além da certificação: mais organização, mais controle e mais economia para a empresa. Além disso, com a divulgação da certificação, novos clientes fecharam trabalhos com a empresa.
O professor Marlon salienta que “é muito satisfatório ver o curso gerando frutos. Isso nos mostra que a formação oferecida é de qualidade e atende às demandas regionais. Contamos com a presença de acadêmicos realizando atividades profissionais e estagiando em variadas empresas e órgãos públicos. Além do mais, a área ambiental apresenta necessidade crescente por profissionais capacitados, o que aumenta a demanda por formados e alunos do curso”.
Também frisa toda a atuação da estudante: “quero enaltecer a qualidade e capacidade técnica da estudante Maria Gabriela, que, sem dúvidas, será uma profissional de destaque na área ambiental. Maria é exemplo de dedicação e proatividade, sempre ativa em atividades como a Empresa Jr. do curso e em projetos de pesquisa e extensão”, enfatiza ele.
Para a estudante, a consultoria foi um desafio, mas também uma grande satisfação “por explicar e mostrar a eles o que poderia ser feito e eles aceitarem. Isso demonstra uma confiança no meu trabalho. O resultado também me deixou muito feliz e me deu bagagem para fazer outras consultorias em indústrias”, finaliza Maria.
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